Giraldo Giraldes, o sem pavor

Fotografia digitalizada a partir de Pereira, Armando de Sousa (2008). “Geraldo Sem Pavor. Um guerreiro de fronteira entre cristãos e muçulmanos, c. 1162-1176”. Fronteira do Caos, Lisboa.

Giraldo Giraldes, o sem pavor (séc. XII)
Militar e mercenário (séc. XII)

Figura controversa de contornos míticos que alimentou o espírito nacionalista português em várias épocas, Giraldo Giraldes ficou na História de Portugal como um dos caudilhos de D. Afonso Henriques, «herói» destemido que, pelos bravos feitos militares, recebeu o epíteto de Sem Pavor. Ligado à tomada de Évora (1165) que uma certa historiografia modelou como empresa táctica e mestra. Hoje, graças ao levantamento documental e a novas fontes históricas é possível gizar uma ideia mais clara, não tanto de Giraldo Giraldes, sobre quem poucos registos existem, mas sobre os seus congéneres: soldados mercenários, bandoleiros, que combatiam a troco de soldo, sem que os movessem intuitos religiosos ou de lealdade.

Por uma falácia, o nome do Sem Pavor ficou ligado ao território concelho de Cinfães. Talvez para favorecer a antiguidade e o valor da linhagem dos Pintos de Riba de Bestança, ou simplesmente por má leitura e interpretação geográfica, surgiu a tradição de que aquele guerreiro teria erguido o seu castelo, ou solar, na serra de Montemuro.

Quem o refere é o general João de Almeida, em 1945, na sua obra Roteiro dos Monumentos Militares Portugueses (vol. 1, p. 578), que remete para a «tradição» que descrevia a «fortaleza» de Chã (Ferreiros de Tendais) como «castelo solarengo construído por Giraldo Giraldes, o Sem Pavor, no reinado de D. Afonso Henriques». A tradição deve ter sido colhida no sexteto do Bispo João Ribeiro Gaio, genealogista e poeta: Com o conde de Portugal / Das Astúrias de Oviedo / Veio D. Mendo Gundar / Com D.Toda casar / De quem nasceu o sem medo / Donde vem este solar. “Sem medo” era o epíteto dado a Giraldo Giraldes e o solar é a desparecida torre de Chã, na freguesia de Ferreiros de Tendais.

Ora, nem a supra citada torre foi fortaleza ou castelo (como se escreve por aí…), se não uma casa-torre ou domus fortis com intuitos diversos dos da defesa militar; nem Giraldo, nas suas deambulações pelo sul e Alentejo viria procurar nas brenhas da ribeira da Bestança lugar para fundar uma linhagem.

A explicação de tal engano é, de certo modo, fácil de destrinçar. Perto de Évora existe uma serra chamada Montemuro. Salienta-se menos na orografia de Portugal, que a do maciço nortenho, pelo que se percebe a confusão dos autores. Já Christóvão Ayres de Magalhães Sepúlveda, na sua «História orgânica e politica do exército portuguêz» (Imprensa Nacional, 1908) referia o Monte Muro, «distante pouco mais de um legua de Évora», como orografia defensiva favorável a Giraldo Giraldes e onde este edificou um castelo. Também o «Mapa de Portugal Antigo e Moderno» de Baptista de Castro, na entrada Monte-Muro, indica: «Está junto a Évora e é parte da Serra de Besteiros» (Typ. do Panorama, 1870, p. 70). Pelo exposto se constata que nem Cinfães, nem, particularmente, a muito ilustre descendência dos senhores de Chã se podem ufanar de ter no passado e nos costados tão particular figura.

Aconselhamos a leitura: https://bit.ly/4fTkOEr

COMO CITAR ESTE ARTIGO:

RESENDE, Nuno – Dicionário Biográfico de Cinfães: Giraldo Giraldes. Pub. em https://historiadecinfaes.pt/2009/10/16/dicionario-biografico-de-cinfaes-giraldo-giraldes-o-sem-pavor (2009). [Consult. 20-07-2013]. Disponível em WWW: <https://www.historiadecinfaes.pt/>

About the author

Nuno Resende, Historiador
Nasceu na vila de Cinfães em 1978

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