Ponte de Covelas: imagem colhida na margem direita. |
Não obstante ser já um monumento icónico do concelho de Cinfães e nomeadamente do vale do Bestança (constitui o símbolo de uma associação local), passaram despercebidos os 250 anos da construção da ponte de Covelas. A estrutura que alguns autores consideraram românica (e até romana!) é afinal um belo pastiche medieval do período barroco, monumental e elegante passagem pétrea que o gosto de uma família local legou para honra do seu nome e serviço dos povos vizinhos. Levantada em cavalete, imita a estrutura das pontes românicas e góticas, como a que existiria nas Pias e a que ainda subsiste sobre o rio Cabrum, quase na sua foz.
Foi mentor da obra o padre Diogo de Sequeira e Vasconcelos, como testemunha a inscrição sulcada no gracioso medalhão colocado a meio da ponte, no remate das guardas do lado norte:
ANO D 1762
ESTA PO.NTE MAND.OU FAZER O REVERENDO.DIOGO CERQUEIRA E VASCONCELOS.PELA SUA ALMA E DE SEOS.PAIS CAPITAM MOR FRANCISCO MEN.DES PINTO E VASCONCELOS E DONA MARIA.NNA DE CERQUEIRA E ATAIDE.MORADORES QUE FORÃO NA SUA QUINTA.DO AZIVEIRO FREGUEZIA. DE FERREIROS.LUGAR DE.COVELLAS ASSESTIO A.FATURA DA OBRA SEU PRIMO FRANCISCO DE SOUZA PINTO.CAPITAM MOR DE TENDAIS
Medalhão comemorativo da edificação. |
O padre Diogo era, como se refere na inscrição, filho dos senhores da casa de Aziveiro que ali tinham morado e, em 1762, já não eram vivos. O pai do eclesiástico falecera em 1703 e a esposa deve tê-lo seguido no decurso da primeira metade do século XVIII. Em 1762 perfazia o padre Diogo os sessenta anos, uma vez que nascera em 1702, sexto e último filho do casal. A descendência da casa do Aziveiro extinguiu-se completamente por terras de Ferreiros de Tendais, mas isso é outra história a contar.
O colaborador, que assistiu à feitura da ponte de Covelas, foi o primo do padre Diogo Sequeira, Francisco de Sousa Pinto, capitão-mor de Tendais. Este morava na margem esquerda da Bestança, no lugar de Valverde e partilhava com o padre Diogo os bisavós maternos Simão Álvares Juzarte e Filipa Mendes de Vasconcelos, casal nobre do lugar de Covelas. Embora não conheçamos nem os artistas que trabalharam na ponte, nem o seu custo, é provável que o capitão-mor de Tendais contribuísse monetariamente para a conclusão da obra que era, afinal, um bem público necessário numa terra pouco dotada de infraestruturas de passagem capazes de assegurar o trânsito de pessoas e bens. Como tal, o nobre Francisco da casa de Valverde não deixou de se recordar na obra, como se infere da inscrição na edícula edificada à entrada da ponte, na margem esquerda:
176[2]
Este
Painel d almas
Mandou fazer po
R sua devoçom
Francisco Men
Des de Souza Pinto
Capitam mor de TENDAES
Francisco Mendes Pinto deixou sucessão do seu casamento com D. Ricarda Inácia Ramalho, mas toda se extinguiu sem descendência como no caso dos seus primos do Aziveiro. Apenas linhas ilegítimas perpetuaram a linhagem dos Mendes e Vasconcelos na freguesia de Tendais. Mas como atrás referimos isso é outra história.
A única lembrança física desta poderosa família dos séculos XVII e XVIII, para além das arruinadas casas de Covelas e Valverde é esta magnífica ponte, um dos mais belos exemplares da intervenção privada e da mestria dos mestres canteiros que a ergueram.
Nuno Resende, Historiador
Nasceu na vila de Cinfães em 1978